Bernardus Henricus Franciscus Hakvoort, ou Bernardo Hakvoort (Bergh,
Holanda, 04 de Outubro de 1949 – Guarapuava, 26 de Junho de 1997) foi um agrônomo,
agricultor e liderança turvense, convicto defensor da agricultura familiar
sustentável e das florestas de araucária.
Neste post você saber mais sobre estas questões:
- Quem foi Bernardo Hakvoort?
- Biografia de Bernardo
Hakvoort.
- Desenvolvimento
Sustentável dem Turvo.
Bernardo Hakvoort, nasceu e cresceu na área rural do município de Bergh, região leste da Holanda, na fronteira com a Alemanha.
Veio para o Turvo a convite do Padre João Adolfo Barendse junto com sua
esposa Inês Vercauteren Hakvoort no ano de 1977. Seu primeiro trabalho foi
visitar as comunidades em companhia do Padre João Adolfo Barendse, conhecendo a
situação de cada uma, em seguida passou a implantar nas comunidades campos
demonstrativos de como melhorar a produção das lavouras tradicionais de milho e
feijão, ao mesmo tempo em que junto com sua esposa começava a organizar grupos
de jovens e de mulheres enviando lideranças para curso de formação.
Produtor Rural, engenheiro formado na Escola Superior de Águas, Solos e
Florestas da Holanda.
Especializou-se em Planejamento e Política de Desenvolvimento Rural, com
estágio e cursos em Israel. Oklahoma (EUA), Portugal, Alemanha e Suíça.
Foi cofundador das seguintes instituições:
- Pastoral Rural da Diocese de Guarapuava;
- Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Turvo;
- Fundação para o Desenvolvimento Econômico da Região Centro – Oeste do
Paraná (Fundação RURECO);
- Instituto Agroflorestal (IAF), do qual foi presidente.
Faleceu em Guarapuava no dia 26 de Junho de 1997.
O MUNICÍPIO DE TURVO E O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL, A PARTIR DO ESTUDO BIOGRÁFICO DE BERNARDO
HAKVOORT
1977-1997
Departamento de História
UNICENTRO, Guarapuava – Paraná
Orientador : Prof. Dr. Ariel José Pires
Resumo: O estudo proposto tem por objetivo, a partir da biografia de Bernardo
Hakvoort e de seus projetos para o desenvolvimento sustentável do
município de Turvo, reconstituir as premissas básicas de seu pensamento, o que
envolve compreender o contexto histórico em que o mesmo estava inserido. Tendo
em vista a seguinte problemática: a produção agrícola dominante das
monoculturas, a conseqüente concentração de renda, e a destruição ambiental,
buscar-se-á evidenciar o trabalho iniciado pelo biografado no município de Turvo,
para a preservação dos remanescentes naturais.
Palavras-chave: biografia, meio ambiente, desenvolvimento
sustentável, agricultura familiar e história.
Abstract: The considered study it has for objective, from the biography of
Bernardo Hakvoort and its projects for the sustainable development of the city
of Turvo, to reconstitute the basic premises of its thought, what it involves
to understand the historical context where the same was inserted. In view of
following the problematic one: the dominant agricultural production of the
monocultures, the consequent concentration of income, and the ambient
destruction, will search to evidence the work initiated for the biografado one
in the city of Turvo, for the preservation of the natural remainders.
Key-words: biography, environment, sustainable development, familiar
agriculture and history.
1. Introdução
Neste início do século XXI, as questões
ambientais estão sendo colocadas em primeiro plano no debate sócio-político. Em
nível mundial, presenciamos uma intensa discussão acerca da queima de
combustíveis fósseis e seus malefícios, no cenário nacional a discussão vai
além da busca por sugestões para os problemas ambientais que estão sendo
evidenciados. Buscam-se também alternativas para diminuir o índice de pessoas
que passam fome, paradoxalmente, nesse país de grande produção agrícola
considerado o “celeiro do mundo”. Torna-se necessário então o incentivo à
agricultura familiar e ao desenvolvimento sustentável com propostas de produção
sem insumos poluidores. A presente pesquisa busca referendar esse processo,
tomando por base projetos desenvolvidos no município de Turvo, entre 1977 e
1997, por meio de um estudo biográfico sobre o ambientalista holandês Bernardo
Harkvoort, cuja atuação para a recuperação e utilização sustentável do
ecossistema, transformou-se em referência para todo o Paraná.
Ao promover a introdução da presente
pesquisa, é necessário que se recorde, que a partir de 1950, o Brasil começou a
desenvolver sua indústria pesada ou de base, e que o desenvolvimento industrial
desse período combinou investimentos estatais em setores estratégicos como a
siderurgia e a geração de energia com investimentos estrangeiros. A mudança
capitalista que se processava no Brasil visava uma maior inserção na economia
mundial exigindo que se aumentassem as exportações em nome do desenvolvimento
econômico brasileiro, repetindo um modelo clássico bastante criticado pelo
historiador Caio Prado Júnior na obra História Econômica do Brasil (1998).
O sociólogo Octávio Ianni, em O
ciclo da revolução burguesa, analisa que nesse contexto de mudança
capitalista iniciou-se uma “política de modernização”, que visava tornar a
agricultura brasileira mais dinâmica e produtiva, por meio de financiamentos
agrícolas, para serem investidos em equipamentos modernos. Mas, a política
modernizadora não levou em conta as implicações sociais que esse processo
acarretaria, a introdução de novas tecnologias no cultivo agrícola geraram uma
redução de mão-de-obra e consequente êxodo rural, além disso, excluiu os
pequenos proprietários desse processo, sendo que essa modernização contribuiu
para fortalecer a concentração de renda. Segundo ele: “O processo histórico da
revolução burguesa brasileira relaciona-se com o problema da formação de uma
economia capitalista. Trata-se de caracterizar a feição autoritária adquirida
pela revolução burguesa no Brasil. Trata-se de uma sociedade na qual a passagem
para o capitalismo ocorre sem alteração na estrutura agrária”. (IANNI,1984, p.
31).
Essa política agrícola privilegiou na
segunda metade do século XX, a grande e a média propriedade com créditos, em
detrimento dos pequenos agricultores. Ianni observa que:
Todas as grandes alternativas concretas vividas pelo nosso país, direta
ou indiretamente, aquela transição (Independência, Abolição, República,
modificação do bloco de poder em 30 e 37, passagem para um novo patamar de
acumulação em 64), encontraram uma resposta na qual a conciliação “pelo alto”,
não escondeu jamais a intenção explicita de manter marginalizados ou
reprimidos, de qualquer modo, fora do âmbito das decisões – as classes e
camadas sociais “de baixo”. (IANNI, 1984, p. 31).
É frente a essa problemática, que
evidencia a utilização inadequada dos recursos ambientais e de uma política
agrícola “excludente”, que empreendemos o presente estudo, onde, procurar-se-á
relatar brevemente a atuação de Bernardo Hakvoort na sociedade
Turvense. Para tanto, apresentaremos uma visão panorâmica da sociedade, bem
como da relação do biografado com a mesma – sua participação em movimentos
sociais, na estruturação de sindicatos, associações e demais projetos que
visavam o desenvolvimento local.
O foco geográfico da pesquisa será o
município de Turvo, ao qual remeter-se-á com o intuito de
compreendê-lo enquanto cenário dinâmico, não só do biografado, mas da
coletividade da qual faz parte. O recorte temporal está centrado entre os anos
de 1977 - referente à chegada de Hakvoort no município, e de
1997 - ano de seu falecimento, o município no período abordado vivenciava a
emancipação política, a corrida pela madeira – principalmente a araucária, e
pela erva-mate, enquanto buscava a formação de uma identidade local e
sobretudo, o progresso econômico.
Tendo em vista tal contexto algumas
perguntas poderão ser colocadas para problematizar o assunto: que motivos o
teriam levado a acreditar no desenvolvimento sustentável, justamente em um
momento histórico em que a mentalidade humana ainda estava impregnada pelos
ideais iluministas como o de progresso? Em um momento em que a população
turvense e paranaense em geral estavam vivenciando a corrida pela madeira? Em
que se baseavam e qual a importância de seus projetos para o desenvolvimento
local da época?
É na busca de levantar hipóteses para
responder a essas e outras perguntas, para refletir sobre o desenvolvimento
auto-sustentável, a viabilidade da agricultura familiar dentro do modo de
produção capitalista e sobre a importância da consciência ambiental nos dias
atuais que conduzir-se-á esse trabalho. Destaca-se ainda como justificativa
para a escolha desse tema à escassez de produção historiográfica sobre o
município.
Como referencial básico para esse
estudo utilizar-se-á a obra: Turvo no caminho do
desenvolvimento sustentável de autoria do biografado, entrevista com Agnes
Vercauteren Hakvoort, e fontes documentais dos arquivos: do
sindicato dos trabalhadores de Turvo, da Associação dos Hortifrutigranjeiros e
do Instituto Agroflorestal Bernardo Hakvoort.
2. A redescoberta da história biográfica
Ao optar pelo tema em questão torna-se
necessário fazer uma breve releitura sobre o estudo biográfico, que durante um
bom tempo foi relegado a um segundo plano por muitos historiadores.
Na transição do século XX para o século
XXI, percebe-se um redespertar, ou como denominaram alguns autores um retorno
do gênero biográfico, que ressurge com uma nova roupagem, não se restringe
apenas em revelar o sujeito através de uma narrativa linear. Sobre essa nova
roupagem, comentou Francisca Nogueira de Azevedo, na obra Biografia e
gênero:
Hoje a biografia é um modelo de escrita da história nitidamente
definida. Há uma metodologia explicitada na qual a biografia não se destina
mais ao julgamento feito por seus autores, mas sim a uma construção relevante
sobre hipóteses cujos pressupostos serão confirmados ou não. Seu objetivo
fundamental é levar a compreensão da época que, como a montagem de um
quebra-cabeça, pouco a pouco vai revelando o que permanente, indicando as
diferenças, permitindo perceber a realidade dos problemas sociais através do
concreto de uma vida. (AZEVEDO, 2000. p. 133).
Assim sendo, torna-se fundamental para o desenvolvimento de um estudo
biográfico a observação feita por Pierre Bourdieu, de que não se pode tratar a
vida como um relato coerente de uma seqüência de acontecimentos, pois tal
procedimento equivaleria a reduzir a vida ao que ele chama de “ilusão
biográfica”.
Tentar compreender uma vida como uma série única e por só suficiente de
acontecimentos sucessivos, sem outro vinculo que não a associação a um
“sujeito” cuja constância certamente não é senão aquela de um nome
próprio, é quase tão absurdo quanto tentar explicar a razão de um trajeto de um
metro sem levar em conta a estrutura da rede ... (BOURDIEU, 1998. p.189).
Além dessas noções - do que o estudo
biográfico pretende ser hoje, e do que ele não pode vir a ser, há que se
articular outros conceitos que servirão de base para a compreensão do tema
proposto. Procurar-se-á interligar a história de vida do biografado,
relacionando-a com o que o município de Turvo possui hoje em
termos de desenvolvimento sustentável, incluindo-se aí a sua relevância para
desenvolvimento da agricultura familiar, para a recuperação e utilização
sustentável, e a própria atuação do Instituto Agroflorestal Bernardo
Harkvoort.
3. O biografado
O biografado, Bernardo Hakvoort,
produtor rural, engenheiro formado pela Escola Superior de Águas, Solos e
Florestas da Holanda, especializado em Planejamento e Política de
Desenvolvimento Rural, com estágios e cursos em Israel, Oklahoma (EUA),
Portugal, Alemanha e Suíça foi co-fundador da Pastoral Rural da Diocese de
Guarapuava, da Associação dos Hortifrutigranjeiros de Turvo, Sindicato dos
trabalhadores rurais de Turvo, Fundação para o Desenvolvimento
Econômico Rural da Região Centro-Oeste do Paraná (Fundação RURECO) e do
Instituto Agro Florestal (IAF).(PREFEITURA MUNICIPAL DE TURVO, 1987).
Em sua obra “Turvo no
caminho do desenvolvimento sustentável” publicada após a sua morte, o
autor apresenta suas ideias para o desenvolvimento de Turvo, para
ele o desenvolvimento tem que ter quatro esteios como base: a fé (ética,
moral), a saúde, o ensino e a economia (a produção).
A principal militância de Hakvoort foi
na área social e econômica, estudar sobre sua vida, seus pensamentos compreende
também perceber o momento histórico no qual estava inserido, o seu envolvimento
com o contexto pode revelar muito sobre a história dessa época.
Hakvoort era filho de
agricultores, nasceu na região leste da Holanda em 04/10/1949, ajudava na
agricultura e nas criações com seus pais, na juventude, como membro de um grupo
de jovens, ajudou na organização da juventude rural da sua comunidade e região,
e trabalhou na organização da Juventude Rural do seu país participando de
vários intercâmbios em diversos continentes. Seguindo a tradição agrícola da
sua família foi para a Universidade e se formou em Engenharia Agrícola e
Recursos Hídricos.
Chegou em Turvo em 1977, com sua esposa Agnes
Vercauteren Hakvoort, seu primeiro trabalho foi visitar as comunidades em
companhia do Padre João Adolfo Barendse, conhecendo a situação de cada uma, em
seguida passou a implantar nas comunidades campos demonstrativos de como
melhorar a produção das lavouras tradicionais de milho e feijão, ao mesmo tempo
em que junto com sua esposa começava a organizar grupos de jovens e de mulheres
enviando lideranças para curso de formação (HAKVOORT, 1998).
Em entrevista temática realizada com Agnes
Vercauteren Hakvoort em 06/07/2007, ela nos relatou que quando
chegaram na região de Turvo, a comunidade recepcionou-os com uma festa, lembrou
com entusiasmo que “no início o povo estava esperando que fizéssemos milagres,
mas a gente não conhecia a realidade aqui, então na verdade nos primeiros dias,
o trabalho era visitar as comunidades com o Padre, e aprender muito; o que era
um pé de mandioca, todas as culturas aqui, e aprender o português que era muito
difícil”. Agnes o conheceu em Portugal, em 1973, nesse momento ele estava muito
envolvido com grupos de jovens, e se preocupava em demasia com problemas
ambientais em nível mundial.
Sobre a vinda para o Brasil relata:
“tínhamos vontade de vir para América Latina, nesse período encontramos
uma carta do Padre João Adolfo Barendse, que pedia um casal para fazer parte de
um trabalho que já estava sendo realizado em Turvo, ele queria um engenheiro
agrônomo para trabalhar, já haviam procurado no Brasil, mas como no momento
vivia-se a revolução verde, os agrônomos eram muito procurados, nenhum queria
vir para o Turvo” (VERCAUTEREN, Entrevista Temática, 06/07/2007).
Um ano depois foi organizada a Associação
dos Hortifrutigrangeiros em Turvo que,
segundo ela tinha “no mínimo vinte sócios, desde o início então a associação
tinha um departamento de provisão, outro administrativo e outro que era mais a
parte educativa, nós trabalhávamos com os jovens e com as mulheres organizando
cursos”. Sobre a comercialização destaca que “naquela época estavam fazendo o
asfalto, tinha uma vila grande de operários, um acampamento onde moravam mais
de 18 famílias, então eles precisavam comprar as coisas, organizamos uma feira
e todo sábado tinha lá então verduras, ovos, leite (...) tinha de tudo lá, era
bem animada aquela feira, muitos anos ela funcionou”.
Hakvoort dava apoio
técnico a esses pequenos produtores, ensinava como utilizar melhor o solo,
horticultura, a fazer adubo orgânico... Quando chegou utilizava-se ainda a
técnica da queimada e a produção apresentava pouca diversidade, era basicamente
composta pelo cultivo do milho e feijão. A partir da criação da associação
passou-se a incentivar outros cultivos e criações, como frangos, nesse momento
a associação estabeleceu vínculos com a Batavo e na medida que a produção foi
aumentando a sobra foi sendo levada para Guarapuava.
Agnes conta-nos que o trabalho
desenvolvido por ela e seu esposo não se restringia ao município de Turvo:
Bem, a gente sempre teve não só trabalho aqui no Turvo, mas
através da igreja ligada a outras paróquias aqui na região através da pastoral
rural, a pastoral rural reunia pessoas da região mas também do Paraná inteiro,
promovia cursos para liderança e nesses encontros o pessoal começou a olhar e
perceber que o Turvo estava se organizando, alguns agricultores estavam
conseguindo progredir. Então Nova Tebas foi o segundo município a se organizar,
o padre pediu para gente organizar um casal para eles começar também esse
trabalho, então veio um casal da Bélgica para trabalhar lá. Depois foi
Laranjeiras e Pinhão, criou-se uma associação em Pitanga, e Bernardo passou
então a desenvolver um trabalho mais na região, com a pastoral rural ajudando a
organizar as associações e também os sindicatos de trabalhadores rurais.
A entrevistada relatou ainda que a
partir de então as pessoas passaram a sentir necessidade de uma organização que
pudesse dar apoio ao trabalho, que estava se desenvolvendo, criou-se então a
Fundação RURECO, da qual Hakvoort foi o primeiro coordenador.
Segundo ela, “ele só deixou a Fundação para se dedicar à preservação das
araucárias, em especial no Turvo, organizou daí o Instituto
Agroflorestal (IAF) que tinha como objetivo a preservação da mata araucária e a
sobrevivência dos agricultores”, o instituto contava com a participação de
“agricultores familiares, envolvia os índios e tinha vários sócios não só do
Turvo, mas de uma região mais ampla, técnicos, agricultores e várias pessoas
envolvidas com a mata. E aí em 97, quando Hakvoort era
coordenador do IAF, ele faleceu”.
Após sua chegada ao município, com a
criação da Associação
dos Hortifrutigranjeirosde Turvo, passou-se a incentivar a diversificação,
organizar a produção e mercado para isso, criou a feira livre em Turvo e
diversos agricultores vendiam na feira de Guarapuava.
Hakvoort buscou
convênios para viabilizar a compra de insumos e a venda da produção,
estabeleceu convênio com a BATAVO, com a COAMIG e CTP – o que garantiu o início
da produção de frangos, o custeio da gerência, o treinamento de agricultores e,
principalmente, o crescimento do movimento associativista em Turvo. Conseguiu,
também, convênio com o governo do Estado e a implantação do escritório da
ACARPA, em Turvo; estabeleceu convênio com o Instituto Cristão de
Castro conseguindo bolsas de estudo para jovens estudantes. Com tal assessoria
a Associação se
fortaleceu, tendo uma boa equipe técnica para assistência às comunidades e aos
clubes de mães.(HAKVOORT, 1998).
Entre 1979 a 90 trabalhou como
coordenador e membro da Pastoral Rural na região, promovendo cursos e
seminários de formação de lideranças, apoiando a organização de entidades nos
demais municípios da região, assim surgiram as Associações de lavradores e
Sindicatos de Trabalhadores Rurais de Nova Tebas, Pitanga, Laranjeiras do Sul e
Pinhão. Em 1986 foi constituída em Turvo a Fundação para o Desenvolvimento
Econômico Rural do Centro-Oeste do Paraná (RURECO), cuja atuação foi
regionalizada e tornou-se bastante representativa em termos políticos,
econômicos e sociais.
Em 1992 Bernardo deixou
a coordenação da Fundação Rureco e dedicou-se a estudar os problemas da
agricultura no Estado e no País, esse trabalho levou tempo, mas deu origem a
Campanha Nacional em Defesa da Agricultura Familiar, refletida nas mobilizações
nacionais de agricultores nos gritos da Terra I, II e III. Em 1995,
voltou a trabalhar com especial olhar para o Turvo e fundou o Instituto
Agroflorestal.
Dedicou-se em escrever e sugerir
propostas de políticas públicas e ideias para planos de governo, sonhava em
formar uma Associação de Proprietários de Terras com Florestas, fazia parte do
conselho de desenvolvimento do município e viveu com entusiasmo a constituição
da Cooperativa de Crédito com Interação Solidária, a terceira CRESOL da
região. De acordo com a entrevistada, “Bernardo queria ver o Turvo como um
exemplo de município, com uma riqueza enorme de natureza e queria ver todo
mundo reunido com esse ideal, por isso que ele escreveu aquele livro, ele
queria deixar um tipo de desafio para quem viesse a trabalhar e a governar o Turvo”.
(VERCAUTEREN, Entrevista Temática, 06/07/2007).
Ao lado do desenvolvimento
econômico desejava um município agradável de viver, com esse intuito escreveu
um livro onde deixou registrada sua visão humana, espiritual, ética e moral;
suas ideias e propostas para resolver os problemas, para melhorar a qualidade
de vida das pessoas, embelezar a cidade, e manter viva a memória de Turvo.
Durante seu depoimento a entrevistada
confessou que Hakvoort além da agricultura, gostava ainda de
música clássica, de ler bons livros sobre assuntos diversos, dos serviços de
marcenaria e construção e até mesmo de fazer brinquedos para as crianças.
Segundo ela, ele se preocupava muito com as relações familiares e com o
desenvolvimento da região, seus projetos tinham um fundo político e econômico,
mas ele estava sempre atento às questões relacionadas à saúde e à educação.
Segundo ela muita coisa não está como
ele sonhava, mas observou que muito do que se iniciou teve continuidade.
Desenvolveu muitas idéias para melhorar as condições de vida e desenvolvimento
da sociedade regional, algumas colocadas em prática e outras que sobrevivem na
sua obra como um plano de desenvolvimento que pode ser adotados pelos herdeiros
de suas crenças.
4. Desenvolvimento Sustentável
Um dos conceitos nucleares que há que
se articular é o de desenvolvimento sustentável, segundo, Norbert Fenzl Doutor
em Geologia e Geoquímica Ambiental, Coordenador do Núcleo de Meio Ambiente
(NUMA), de um modo geral o desenvolvimento sustentável articula-se levando em
conta as seguintes metas e objetivos básicos: a taxa de consumo de recursos
renováveis não deve ultrapassar a capacidade de renovação dos mesmos; a
quantidade de rejeitos produzidos não deve ultrapassar a capacidade de absorção
dos ecossistemas; os recursos não renováveis devem ser utilizados somente na
medida em que podem ser substituídos por um recurso equivalente renovável. O
autor conclui que “resumindo podemos dizer que em última instância, o conceito
de desenvolvimento sustentável descreve um processo socioeconômico,
ecologicamente sustentável e socialmente justo” (FENZL).
Dessa forma, o desenvolvimento autossustentável
coloca-se não só como uma alternativa para a agricultura, mas também para
contornar os graves problemas sociais e ambientais, característicos do atual
modo de produção capitalista.
Entendendo-se que o Paraná é um dos
maiores produtores agrícolas do Brasil e se destaca no que diz respeito ao
desenvolvimento sustentável e a agricultura familiar. Desde o princípio da
colonização do Brasil, a agricultura familiar, ainda que não conceituada
devidamente parece ter uma importância muito vasta no que diz respeito à
sobrevivência e desenvolvimento do campo. Porém foi só no final da década de
1970, que se iniciou na região centro-oeste do Paraná um trabalho de
organização dos agricultores familiares, foi uma tentativa para melhorar o desenvolvimento
local, assessorado por pastorais católicas, tais como: Pastoral Rural, e
Fundação RURECO.
No município de Turvo essa
organização tornou-se visível a partir de 1977, com a vinda do casal Bernardus
Henricus Franciscus Hakvoort e Agnes Vercauteren Hakvoort,
que passam a organizar e assentar as bases para a formação de uma associação
para representar e organizar os pequenos produtores. O município nessa época
não contava com nenhuma assistência ou orientação técnica de qualquer órgão à
agricultura, quer Estadual ou de cooperativas regionais, Bernardo e
Inês (como eram chamados) passaram a promover reuniões para a
conscientização dos agricultores.
O biografado em sua
obra Turvo no caminho do desenvolvimento sustentável,
expressa sua concepção sobre desenvolvimento sustentável, ao abordar sobre
religião nos passa o seu parecer sobre como deve ser o desenvolvimento, segundo
ele é impossível proceder com um plano de desenvolvimento desvinculado da
religiosidade, o uso indiscriminado de agrotóxicos na agricultura bem como a
destruição das florestas é entendida por ele como um desajuste entre o homem e
o conjunto da Criação, criador e criação devem estar ligados para o bem comum.
O autor escreve sobre religião sobre
sua importância e sobre o próprio sentido da palavra religião, no entanto não
faz apologia a nenhuma religião em específico, ao contrário considera que as
religiões são caminhos diferentes que convergem para o mesmo ponto, e que sendo
assim não há importância em seguirmos por caminhos diferentes desde que
alcancemos o mesmo objetivo, seu trabalho levou em conta o ecumenismo, como
citou Agnes em entrevista:
Ele sempre se interessou muito pela questão da origem do cristianismo,
na verdade ele fez um curso na Holanda de licenciatura para dar aula de
religião, mas na verdade era mais uma busca pessoal para achar resposta de quem
é Jesus, da onde que veio, por que a igreja? Porque as religiões? Então ele se
interessava muito por isso. Embora que, por outro lado, aqui no Turvo ele
procurava muito o ecumenismo, então ele se dava muito bem com todas as igrejas,
uma relação boa com a igreja presbiteriana, luterana, católica. Ele sempre
procurou aproximar muito as pessoas, acho que isso foi uma característica muito
forte do Bernardo tanto a partir das igrejas quanto entre pequenos e grandes
produtores, em beneficio da mata ele conseguia conversar com todo mundo, com os
políticos dos vários partidos, com as serrarias, com os proprietários das
terras, com os pequenos agricultores, ele conseguia trazer todo mundo e achava
que era importante que todos tivessem o mesmo objetivo de tentar preservar esse
patrimônio que Turvo ainda possuía.(VERCAUTEREN, Entrevista Temática,
06/07/2007).
Quanto à preservação ambiental, a
principal preocupação do biografado era com a Araucária, abundante no município
na época, mas que sofria uma grande devastação, pois o período abordado era de
grande procura, vale lembrar que em 1987 dez anos após a chegada de Hakvoort,
o município contava com aproximadamente vinte serrarias, um grande número se
levarmos em conta a população da época. Em sua obra ao falar sobre a
industrialização, supõe que a madeira seja utilizada de forma a gerar mais
renda e preservando as florestas, a exemplo disso sugere incubadoras
industriais, o beneficiamento das madeiras no município seria uma forma de
gerar mais renda. Tais incubadoras deveriam ser colocadas em terrenos para
indústrias perto do Turvo e outras nos distritos, aliás, o seu programa de
desenvolvimento num todo era para uma industrialização descentralizada, que
atingisse a todos, isso se justifica no fato de acreditar no desenvolvimento
que leva em conta a família e a preservação.
Segundo esse pensamento,
automaticamente o dinheiro ganho na indústria possibilitaria mais investimentos
nas chácaras, a agricultura familiar ajudaria a pequena indústria com a
mão-de-obra e a indústria à agricultura familiar garantindo uma renda extra, e a
permanência das famílias no campo. No município de Turvo houve
e ainda há uma grande emigração de jovens devido à falta de
perspectiva/emprego, se analisássemos mais a fundo verificaríamos que a
população principalmente interiorana é hoje na sua maioria formada por pessoas
mais velhas. A economia nessa época caracterizava-se pela agropecuária e
indústria madeireira, apresentava umas das maiores produções de erva mate da
região centro-oeste, no entanto não havia nenhum tipo de planejamento para
extração controlada dessas espécies, essa era uma das grandes preocupações de Hakvoort,
gerar renda, e manter as pessoas em seu ambiente cultural, com melhores
condições de vida e fazendo uso adequado desse habitat.
Ao tratar da industrialização não
esqueceu da indústria de confecção e de artesanato, a comunidade indígena tinha
uma produção artesanal riquíssima, destaca o trabalho com ferraria, calçados e
artesanatos em couro, além das costureiras, bordadeiras. Trabalhos como, os de
marceneiros, carpinteiros, pedreiros, deveriam ser preservados e valorizados,
jovens e adolescentes poderiam ter aulas com as pessoas do município mesmo,
logo, reconhece a importância do apoio da Administração Pública neste setor,
isso se faria através da promoção de cursos, treinamentos, incentivos para
ampliação da atividade já existente e instalação de novas indústrias.
O autor evidencia o interesse da
população do município em produzir leite, erva-mate e peixes, que para ele são
excelentes culturas especialmente para pequenas e médias propriedades, para
propriedades com Faxinal e com cobertura florestal, podendo ser combinadas, um
bom projeto de incentivo deveria ser elaborado. Orientava ainda, as pessoas
sobre como e o que fazer para termos maior produção levando em conta as preservações
sugeridas (culturais e ambientais).
No pensar de Hakvoort a
agricultura familiar era um privilégio para o município, segundo ele essa forma
de agricultura já havia mostrado sua importância a nível mundial, por oferecer
produtos mais saudáveis e baratos, proporcionando emprego para muitas pessoas,
enquanto que as grandes empresas rurais acabam optando por um pacote
tecnológico que como sabemos requer menos mão de obra, mais agrotóxicos e que
afeta diretamente os ecossistemas. Segundo ele os governos municipais,
estaduais e federais têm boas razões econômicas, ecológicas e socioculturais
para investirem na agricultura familiar.
5. Sementes que geram frutos
O Instituto Agro Florestal Bernardo
Hakvoort (IAF), surgiu com a missão de promover a conservação e
enriquecimento dos remanescentes florestais, bem como para a recuperação dos
ambientes florestais já degradados, e buscar a melhoria das condições de vida
das famílias agricultoras que ali residem, produzem e vivem, através do
desenvolvimento da agricultura familiar sustentável, baseada na agroecologia
(INSTITUTO AGROFLORESTAL BERNARDO HAKVOORT). Atualmente desenvolve
vários projetos, organiza os Agricultores em grupos ou cooperativas, dando
sustentação para o desenvolvimento desses.
Hakvoort sempre insistia
que: “(...) não podemos pensar pequeno, no sentido de atingir poucos
produtores, precisamos pensar grande; montar um projeto que atinja o município
inteiro” (HAKVOORT, 1998, p.10). E assim o Instituto vem
procurando estimular à produção a preservação com o intuito de promover o
desenvolvimento ecologicamente e socialmente correto do município.
Ao narrar o que presenciava no
município, Hakvoort chama atenção para os projetos ecológicos
e sua importância para o futuro da região:
Terra dos pinheirais até quando? Quando cheguei no Turvo, 20
anos passados, Turvo era rodeado por Pinheirais fechados. Ninguém imaginava que
isto iria mudar. Nos últimos anos estão surgindo grandes “buracos” dentro desta
bela floresta. Os Pinheirais de Turvo estão ameaçados com o
desaparecimento. O rápido corte da floresta está se tornando um desastre
ecológico, econômico e sócio- cultural. Sem as florestas de araucárias, Turvo não
tem futuro. Turvo esta matando a galinha que poderia botar ovos de ouro. (HAKVOORT,
1998, p.35)
Sua atuação despertou a preocupação de algumas lideranças que resolveram
criar uma Organização Não Governamental, o IAF, que tinha por objetivo apoiar a
Agricultura Familiar na área agroflorestal, junto com os proprietários das
florestas e faxinais achar caminhos para a preservação com uso deste importante
ecossistema. Ao entender que a preservação não é só responsabilidade dos
proprietários, mas também de toda comunidade, o Instituto desenvolve sistemas
de manejo que aumentam a renda por alqueire e passa a pesquisar alternativas
que aumentem a renda dos proprietários das florestas.“Vamos trabalhar
juntos, para garantir que isto se torne realidade. Deus criou este belo jardim
das Araucárias. É responsabilidade de todos nós de respeitar e manter esta obra
do senhor”.(HAKVOORT,1998, p.36).
Com relação à preservação das florestas
e faxinais (muito presentes ainda no município), destaca a importância de
apoiarmos as pessoas que fazem o possível para preservar as últimas florestas
da araucária, para que possa haver a preservação é preciso aumentar a renda na
propriedade, mas isso levando em conta todos os fatores que compõem a
sustentabilidade.
Considerações finais
Após pesquisarmos brevemente parte da
vida de Bernardo Hakvoort, percebe-se nele um estudioso do
município, estudou aspectos geográficos como clima, solo, relevo e aspectos
sociais, culturais e econômicos. E um memorialista, afinal todo seu trabalho
foi feito com um olhar no passado, nas tradições, nas técnicas utilizadas pelos
agricultores, com o intuito de utilizá-las e preservá-las.
Foi ainda, um político, no sentido em
que buscou representar a população e lutar pelos seus interesses e um crítico
de Turvo, pois conseguia vislumbrar as diferenças sociais e conflitos da
sociedade.
A partir de seus escritos percebe-se
sua preocupação com o turismo em Turvo, Hakvoort acreditava
que o município tinha possibilidade de se tornar um dos mais importantes
centros turísticos do Sul do País, pensava em turismo de saúde – em virtude da
rica flora de plantas medicinais, e também com a memória, compreendendo a
importância de preservar a história do município.
Dizia ele: “Turvo é
um município com história, ou melhor, com uma população que tem uma rica
história. É muito interessante falar com pessoas que ainda sabem como viviam os
antepassados, muitos moradores do nosso município têm pais e avôs que ainda
vieram da Europa, ou eram índios com sua rica cultura” (HAKVOORT, 1998,
p.21).
O ambientalista gostaria de ter trabalhado na elaboração de um livro
sobre a história do Turvo, e queria que o mesmo fosse feito através
da pesquisa oral, defendia também a implementação de um museu onde ficariam
guardados quaisquer “documentos” do passado: fotos, ferramentas, pilões, rodas
de água, carroças, etc, com espaço para todas as etnias radicadas no Município.
Seu interesse pela história leva em conta todas as classes, etnias, e todos os
aspectos, ou seja, valoriza coisas pequenas e cotidianas, não fica só na
história do desbravador ou da emancipação política.
Em sua obra apresentou idéias que a seu
ver poderiam tornar o Turvo um município bonito e típico no meio dos
pinheirais, com qualidade de vida e história, pretensão possível a seu ver, se
houvesse interesse comum.
Esses são alguns aspectos que se pode
esboçar no espaço de um artigo, o presente estudo não tem a pretensão de ser
completo, todavia aspira contribuir para a produção historiográfica turvense e
suscitar novos questionamentos acerca dos assuntos por ora elencados.
Referências
BARCELOS, Cezar Augusto; AZEVEDO, Francisca Nogueira e outros. Questões
de teoria e metodologia da história. Biografia e gênero. UFRGS,
2000.
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, M.;
AMADO, J. Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: FGV,
1998.
FENZL, Norbert. Desenvolvimento Sustentável e a Agenda 21.
Disponível em: . Acesso em: 05 de jan. de 2007.
HAKVOORT, Bernardo. Turvo no caminho do desenvolvimento
sustentável. Guarapuava: Editora da Unicentro, 1998.
IANNI, Octavio. O ciclo da revolução burguesa. Rio
de Janeiro: Editora Vozes, 1984.
INSTITUTO AGROFLORESTAL BERNARDO HAKVOORT. Disponível em : . Acesso
em: 25 de set. de 2007.
PRADO JUNIOR, Caio – História Econômica do Brasil. São
Paulo: Editora Brasiliense, 1997.
PREFEITURA MUNICIPAL DE TURVO. Turvo Cidade dos Pinheirais. Londrina:
Gráfica Modelo, 1987.
VERCAUTEREN HAKVOORT, Agnes. Entrevista temática concedida em 06
de jul. de 2007.
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